Superação do visível
Presidente de empresa municipal de Odivelas é quase cego e só aprendeu a ler Braille aos 20 anos
00h30m
LUÍS GARCIA
Aos 20 anos, era analfabeto e tinha passado a sua juventude a saltitar de trabalho em trabalho e a ajudar o seu pai numa fazenda no mato angolano. Aos 54,
dirige uma empresa municipal de Odivelas e um dos centros culturais mais importantes da Grande Lisboa. Um pormenor: Rui Nascimento é quase cego.
Um parto complicado, em Angola, corria o ano de 1955, foi um prenúncio de que Rui Nascimento teria de se esforçar muito para triunfar. Retirado a ferros,
desenvolveu uma infecção intra-ocular que degenerou num glaucoma, acabando por ficar com a visão reduzida a cerca de quatro por cento. Ou seja, como o
próprio explica, vê "20 vezes menos do que uma pessoa com visão normal, com um dos olhos tapados".
Até aos 20 anos, viveu em Angola - onde chegou a andar de mota e bicicleta, dada a pacatez das estradas da zona - e exerceu vários ofícios, sobretudo no
comércio e na fazenda do pai. Nunca lhe foi dada oportunidade de estudar porque não tinha condições para frequentar a instrução regular e não existia ensino
especial. Só quando veio para Portugal, em 1975, e quis aprofundar os conhecimentos de música soube da existência de um sistema de leitura da cegos, o
Braille, que aprendeu em seis ou sete lições.
De analfabeto, aos 20 anos, passou para licenciado em Direito peaos 34. Pelo caminho, nunca deixou de trabalhar, primeiro no comércio, depois como cobrador,
paquete de uma associação e funcionário da administração pública, onde fez carreira.
Em 2006, foi convidado para criar o Gabinete de Auditoria Interna da Câmara de Odivelas e ali ficou até 2009, altura em que assumiu a direcção da Municipália,
empresa municipal responsável pela gestão das piscinas municipais e do Centro Cultural da Malaposta.
Apesar de admitir a existência de um estigma social em relação aos deficientes, Rui Nascimento garante que o seu problema nunca o impediu de "fazer fosse
o que fosse". O presidente da Municipália, casado e com quatro filhos, acredita que a sua capacidade para ultrapassar as dificuldades se deve à educação
que os pais lhe deram, exigindo que não usasse a deficiência como desculpa para se acomodar.
Fonte: JN
-
Partilhe no Facebook
no Twitter
- 1731 leituras