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Lua Azul - blog de lua azul

Viajando pelo mundo dos livros... "O Livro do Destino" de Brad Meltzer - Sinópes e 1.º Capítulo

por lua azul

Terminada a minha primeira partilha no que se refere à publicação na íntegra de certas obras literárias que vou encontrando aqui pela Net e depois decido transpô-las também aqui para o blogue de modo a facilitar tanto quanto possível a sua leitura por parte de pessoas com problemas visuais que ainda sintam dificuldades ao nível da realização de downloads, eis que a segunda parece ter chegado finalmente. Desta vez o livrinho que escolhi despertou-me um certo interesse pelo seu curiosíssimo título e daí que tenha decidido que seria ele o próximo a ser disponibilizado aqui pelo blogue: " O Livro do Destino", não vos parece algo absolutamente fascinante um título destes?
O seu autor é Brad Meltzer tendo a obra sido publicada em 2006 e a sinópse versa sobre as seguintes palavras:

"No centro do poder mundial, os símbolos são muito mais do que representam para os simples mortais. A cidade de Washington, nos EUA, guarda um segredo de mais de duzentos anos. E ele precisa ser cultivado pelos escolhidos. Somente eles podem fazer as regras… O que poucos sabem é que tudo está escrito no O Livro do Destino. Neste thriller inovador, o aclamado autor Brad Meltzer surpreende com personagens enigmáticos e uma trama intrigante. Códigos e seitas secretas se combinam numa história desafiadora. Não há escapatória. Tudo acontece por uma razão. O Livro do Destino guarda os segredos de cada um, especialmente daqueles que merecem morrer por ele. O que será que ele diz sobre você?".

Algo misterioso, não? E se começássemos então a desvendar este mistério todos juntos aqui pelo blogue? Parece-vos bem? Então aqui vos deixo o primeiro capítulo, prometendo que o segundo será publicado tão rapidamente quanto possível!

1

Dentro de seis minutos, um de nós estará morto. Este é o nosso destino.
Ninguém suspeitava que isto iria ocorrer.
"Ron, espere!", gritei, perseguindo o homem de meia-idade vestido com um
terno azul-marinho. Enquanto eu corria, o calor sufocante da Flórida colava a
camisa ao meu peito.
Ignorando-me, Ron Boyle corria pelo asfalto, passando pelo Força Aérea Um
à nossa direita e os dezoito carros da comitiva que conduziam as pessoas
importantes para a cerimônia pública e que estavam alinhados em fila única à
nossa esquerda. Como chefe da assessoria, ele estava sempre afobado. É o que
acontece quando se trabalha para o homem mais poderoso do mundo. Não digo
isto levianamente. Nosso chefe era O Comandante Supremo. O presidente dos
Estados Unidos. E, quando ele queria algo, era minha tarefa consegui-lo. Bem
nesse momento o presidente Leland "O Leão" Manning queria que Boyle
permanecesse calmo. Mas algumas tarefas estavam acima de minha
capacidade.
Aumentando a velocidade enquanto se misturava com a multidão de
funcionários e membros da imprensa que se dirigiam para os carros designados,
Boyle moveu-se rapidamente até um Chevy Suburban preto e lustroso
estacionado perto dos agentes do Serviço Secreto e da ambulância que
transportava alguns litros de sangue do mesmo tipo que o do presidente. Antes,
Boyle deveria ter tido uma reunião de quinze minutos com o presidente no Força
Aérea Um. Por causa de um erro meu no planejamento do horário, ela havia
sido agora reduzida a três minutos de instruções específicas durante um translado
de carro, em algum momento da tarde. Dizer que ele estava aborrecido seria
chamar a Grande Depressão de um mau dia no escritório.
"Ron!" chamei de novo, colocando uma mão em seu ombro e tentando
desculpar-me. "Espere. Eu queria..."
Ele girou violentamente, empurrando com força minha mão.
Delgado, com um nariz significativo e um denso bigode destinado a
compensá-lo, Boyle tinha cabelos grisalhos, a pele cor de oliva e impressionantes
olhos castanhos com um pequeno pingo de luz azul em cada íris. Quando ele se
inclinou para a frente, seus olhos de felino brilharam para mim. "Não me toque
de novo a não ser para me apertar a mão", ameaçou-me, enquanto umas gotas
de saliva atingiam meu rosto.

Rangendo os dentes, eu as limpei com as costas da mão.
Certo, a falha de planejamento fora minha, mas, ainda assim, isso não era
razão para...
"Agora, que diabos é tão importante assim, Wes, ou isto é mais um lembrete
vital de que, quando vamos comer com o presidente, precisamos lhe entregar
nossos pedidos para o almoço pelo menos uma hora antes?" ele acrescentou, em
voz bastante alta para que alguns agentes do Serviço Secreto se voltassem.
Qualquer outro jovem de vinte e três anos tomaria isso ao pé da letra. Eu
fiquei frio. Este é o trabalho de um auxiliar do presidente... como uma pessoa da
equipe... como o faz-tudo...
Consegue para o presidente o que ele deseja; mantém a máquina ativa.
"Deixe-me recompensá-lo", eu disse, desistindo mentalmente de desculpar-
me. Se eu quisesse que Boyle ficasse quieto — se não desejasse uma cena diante
da imprensa —, eu precisava elevar o pagamento. "E se eu... se eu o puser dentro
da limusine do presidente agora mesmo?"
A postura de Boyle endireitou-se ligeiramente enquanto ele começava a
abotoar o paletó de seu terno. "Eu achava que você... Não, isto é bom. Ótimo.
Excelente." Ele até esboçou um pequeno sorriso. Crise contornada.
Ele pensava que tudo estava perdoado. Minha memória, porém, durava um
pouco mais. Enquanto Boyle se voltava triunfalmente para a limusine, eu anotei
em minha agenda mental. Bastardo arrogante. Na volta, ele iria na traseira da
van da imprensa.
Politicamente, eu não era apenas bom. Eu era excelente. Não estou me
vangloriando; é a verdade. Não se solicita um emprego como este, a pessoa é
convidada para uma entrevista. Qualquer jovem político ambicioso teria matado
para poder ficar tão próximo do líder do mundo livre. Desse posto, meu
antecessor saiu para tornar-se o número dois na Imprensa Oficial da Casa
Branca. Seu antecessor conseguiu um emprego para comandar quatro mil
pessoas na IBM.
Sete meses antes, apesar de minha falta de contatos, o presidente me
selecionou. Eu me saí melhor que o filho de um senador e um par de bolsistas
Rhodes.[1] Então, eu podia certamente dar conta de um antigo e mal-humorado
membro da assessoria.
"Bem, vamos embora!" chamou o chefe da equipe do Serviço Secreto,
acenando para que entrássemos no carro enquanto ele se sentava no assento do
passageiro, no banco da frente, de onde podia ver tudo o que acontecia.
Puxando Boyle e mantendo à frente a minha maleta de couro de pendurar no
ombro, entrei na parte traseira da limusine blindada, onde o presidente estava
vestido informalmente com uma jaqueta preta esportiva e jeans.
Supus que Boyle fosse começar a falar imediatamente, mas, quando passou
diante do presidente, estava estranhamente silencioso. Curvado enquanto se

dirigia para o assento de trás, à esquerda, o paletó de Boyle abriu-se, mas ele
rapidamente levou a mão ao peito para mantê-lo fechado.
Somente mais tarde fui perceber o que ele estava escondendo. Ou o que eu
acabara de fazer ao convidá-lo para a limusine.
Entrando atrás dele, agachei-me em direção a um dos três bancos dobrados
na traseira do carro. O meu ficava de costas para o motorista e ao lado de Boyle.
Por razões de segurança, o presidente sempre se sentava no assento de trás à
direita, com a primeira-dama acomodada entre ele e Boyle.
O assento móvel diante do presidente — o melhor assento — já estava
ocupado por Mike Calinoff, o piloto profissional de carros de corrida aposentado,
e um convidado especial para o evento do dia. Não era surpresa. Faltando apenas
quatro meses até a eleição, estávamos somente três pontos à frente nas pesquisas.
Quando os eleitores estavam tão instáveis, apenas um tolo entraria na arena do
gladiador sem uma arma escondida.
"Então ela é rápida, mesmo com um colete à prova de balas?", perguntou o
campeão de corridas, admirando o azul-noite do interior do Cadillac Um.
"Extremamente rápida", respondeu Manning, enquanto a primeira-dama,
aborrecida, desviava o olhar.
Juntando-se finalmente a eles, Boyle inclinou-se à frente em seu assento e
abriu uma pasta de papéis de cânhamo.
"Senhor presidente, se pudéssemos...?"
"Perdão — isso é tudo que podemos fazer, senhor", interrompeu o chefe do
Estado-Maior Warren Albright, enquanto entrava na limusine. Estendendo um
jornal dobrado para o presidente, ele acomodou-se no assento do meio
diretamente na frente da primeira-dama e, mais importante, diagonalmente em
relação a Manning. Mesmo em um assento traseiro para seis pessoas, a
proximidade era importante. Sobretudo para Boyle, que ainda estava virado para
o presidente, recusando-se a desistir de sua oportunidade.
O presidente pegou o jornal e examinou o jogo de palavras cruzadas que ele
e Albright partilhavam todos os dias. Isso era uma tradição entre eles desde os
primeiros dias de campanha — e era a razão pela qual Albright estava sempre
naquele lugar cobiçado, na diagonal em relação ao presidente. Albright
começava cada jogo, ia até onde conseguia, depois o passava para o presidente
terminá-lo.
"A linha quinze está errada", indicou o presidente, enquanto eu colocava
minha maleta no colo. "Abafar."
Não raro, Albright odiava quando Manning encontrava um erro. Hoje,
quando percebeu Boyle no assento do canto, ele tinha algo novo em folha com
que se aborrecer.
"Está tudo em ordem”? Perguntei, dando uma olhada.
Antes que Albright pudesse responder, o motorista deu partida, e meu corpo

arremessou-se para a frente.
Três minutos e meio, a partir de agora, o primeiro tiro iria ser disparado. Dois
de nós cairiam ao chão, com espasmos.
Um não se levantaria.
"Senhor, posso ter sua atenção por um minuto?"
Interrompeu Boyle, de modo mais insistente do que antes.
"Ron, você não pode apenas desfrutar do trajeto?" Provocou a primeira-
dama, seu cabelo castanho curto agitando-se quando batemos em um torrão de
terra na estrada. Apesar do tom suave, eu percebi o brilho em seus olhos verde-
folha.
Era o mesmo olhar penetrante que ela costumava dar a seus alunos em
Princeton. Antiga professora com Ph.D em química, a dra. primeira-dama era
treinada para ser valente.
E o que a dra. primeira-dama queria, a dra. primeira-dama lutava para ter. E
conseguia.
"Mas, senhora, só vou levar..."
Suas sobrancelhas se franziram tanto que chegaram a se juntar. "Ron, desfrute
o passeio"
Nesse ponto muitas pessoas teriam parado. Boyle insistiu mais fortemente,
tentando entregar a pasta de papéis diretamente para Manning. Ele conhecia o
presidente desde quando ambos tinham vinte anos e estudavam em Oxford.
Banqueiro de profissão, bem como um colecionador de antigos truques de
magia, ele mais tarde administrara todo o dinheiro dos Manning, um truque que
por si só era mágico.
Até hoje, ele fora a única pessoa do quadro de funcionários a estar presente
quando Manning se casou com a primeira-dama. Só esse fato lhe proporcionara
passe livre quando a imprensa descobriu que o pai de Boyle era um bom
vigarista que havia sido condenado duas vezes por fraude de seguro. Era o
mesmo passe livre que ele estava usando agora na limusine para testar a
autoridade da primeira-dama. Mas mesmo os melhores passes livres chegam ao
fim.
Manning sacudiu a cabeça de modo tão sutil que apenas um olhar treinado
poderia percebê-lo. Primeira-dama, um; Boyle, zero.
Fechando a pasta de papéis, Boyle recostou-se e me enviou o tipo de olhar
que causaria um ferimento. Agora a culpa era minha.
Quando nos aproximamos de nosso destino, Manning olhou silenciosamente
através do matiz verde-claro da janela à prova de balas. "Vocês sabem o que
Kennedy disse três horas antes de receber os disparos?", perguntou, usando o seu
melhor sotaque de Massachusetts. "Sabe, a noite passada teria sido uma bela noite
para matar um presidente"
"Lee!" Ralhou a primeira-dama. "Você vê com o que tenho de lidar?", disse

ela, rindo de modo disfarçado para Calinoff.
O presidente pegou a mão dela e a apertou, olhando para o meu lado. "Wes,
você trouxe o presente que consegui para Calinoff?", ele perguntou.
Eu procurei em minha maleta de couro — a maleta de truques — sem
desviar os olhos do rosto de Manning. Ele esboçou um leve assentimento e
esfregou seu pulso. Não lhe dê o prendedor de gravata... pegue o presente maior.
Eu tinha sido seu auxiliar por mais de sete meses. Se eu estava realizando o
meu trabalho direito, não tínhamos de falar para nos comunicarmos. Já caíramos
na rotina. Só pude sorrir.
Esse foi o meu último amplo sorriso. Dentro de três minutos a terceira bala do
atirador rasgaria minha bochecha, destruindo muitos nervos. Nunca recuperei o
pleno uso de minha boca de novo.
Da minha maleta abarrotada, que continha tudo o que um presidente pudesse
desejar, eu retirei um conjunto de abotoaduras de funcionário oficial do
presidente e a entreguei para Calinoff, que estava adorando cada segundo em seu
banco dobrável, um assento quente completamente desconfortável.
"Estas são de verdade, você sabe", disse o presidente. "Não as coloque no
eBay."
O presidente usava a mesma piada cada vez que presenteava alguém com as
abotoaduras. Nós ainda ríamos.
Mesmo Boyle, que começara a coçar o peito. Não há melhor lugar para se
estar por dentro de uma piada do que com o presidente dos Estados Unidos. E no
4 de Julho em Daytona, na Flórida, quando é dado o sinal de partida gritando
"Senhores, coloquem suas máquinas em movimento!", na lendária corrida
NASCAR Pepsi 400, não há melhor posição secundária no mundo.
Antes que Calinoff pudesse agradecer, a limusine parou.
Uma luz vermelha disparou a faiscar à nossa esquerda — dois policiais em
motocicletas com suas sirenes soando alto.
Eles estavam avançando, saindo de trás da comitiva de carros que conduzem
pessoas importantes. Como numa procissão de funeral.
"Não me diga que eles fecharam a estrada", disse a primeira-dama. Ela
odiava quando eles paravam o trânsito por causa desses automóveis que seguiam
o presidente. Aqueles eram votos que nunca seriam recuperados.
O carro lentamente moveu-se alguns centímetros à frente.
"Senhor, estamos quase entrando na pista", anunciou do banco da frente o
chefe do serviço de segurança. Do lado de fora, a ampla pista de concreto de
pouso e decolagem do aeroporto rapidamente deu lugar a fileiras e fileiras de
automóveis com motores de alta qualidade.
"Espere... vamos entrar na pista?", perguntou Calinoff, subitamente excitado.
Ele se mexeu em seu assento, tentando ver do lado de fora.
O presidente sorriu. "Vocês acham que conseguiremos um par de lugares na

frente?"
As rodas saltaram sobre uma placa de metal ressoante que vibrou como uma
tampa solta de boca de lobo. Boyle esfregou seu peito mais ainda. Um ruído
surdo e prolongado de barítono encheu o ar.
"É um trovão?", perguntou Boyle, olhando para o céu azul-claro.
"Não, não é um trovão", replicou o presidente, apoiando as pontas dos dedos
contra a janela à prova de balas enquanto a multidão no estádio de duzentas mil
pessoas erguia-se com bandeiras, estandartes e braços acenando. "É aplauso."
"Senhoras e senhores, o presidente dos Estados Unidos!", gritou o locutor no
sistema eletrônico de som.
O firme braço direito de um segurança nos indicou para seguir em direção a
uma lateral, enquanto a limusine entrava em uma pista de corridas, a maior,
mais perfeitamente pavimentada rodovia que jamais havia visto em minha vida.
"Belas rodovias vocês têm aqui", disse o presidente a Calinoff, recostando-se
no couro macio do assento feito sob medida para o seu corpo.
Tudo o que havia à esquerda era a grande entrada. Se não tivéssemos entrado
triunfalmente por ali, as duzentas mil pessoas que estavam no autódromo, mais os
dez milhões de telespectadores, mais os setenta e cinco milhões de fãs
comprometidos com a NASCAR, iriam todos dizer a seus amigos e vizinhos e
primos e estranhos nos supermercados que nós arruinamos o nosso batismo e
desprezamos a água sagrada.
Mas foi por isso que trouxemos uma comitiva de automóveis. Não
precisávamos de dezoito carros. A pista do aeroporto de Daytona está, na
verdade, muito próxima da pista de corrida. Não haveria luzes vermelhas para o
percurso. Nem tráfego para impedir. Mas, com todos olhando... Você já viu uma
comitiva de automóveis do presidente em uma pista de corrida? É um delírio
americano instantâneo.
Não me importava quão próximos do adversário estávamos nas pesquisas.
Uma volta completa na pista e tomaríamos nossos assentos para a inauguração.
À minha frente, Boyle não estava tão emocionado. Com os braços cruzados
sobre o peito, ele nunca parou de observar o presidente.
"As estrelas também vieram, hein?", perguntou Calinoff quando entramos na
última volta e vimos o nosso comitê de recepção, um pequeno grupo de pilotos da
NASCAR, todos enfeitados em suas roupas multicoloridas, com emblemas de
propaganda. O que o seu olhar destreinado não percebeu foram os cerca de doze
"membros da equipe" que estavam parados um pouco mais eretos do que os
outros. Alguns usavam mochilas nas costas. Outros carregavam mochilas de
couro. Todos usavam óculos escuros. E um falava num aparelho em seu pulso.
Serviço Secreto.
Como qualquer outro que andasse na limusine pela primeira vez, Calinoff
estava praticamente lambendo o vidro. "Senhor Calinoff, será o primeiro a

descer", eu lhe disse quando chegamos diante da seção de poltronas. Do lado de
fora, os pilotos já estavam se posicionando em ângulo até o lugar do presidente.
Dentro de sessenta segundos eles estariam correndo para vencer.
Calinoff inclinou-se para sair pela minha porta, do lado do motorista, onde
todos os pilotos da NASCAR estavam amontoados.
Inclinei-me para impedi-lo, mostrando a porta do presidente do outro lado.
"Daquele lado", eu disse. A porta mais próxima dele.
"Mas os pilotos estão do outro lado", objetou Calinoff.
"Ouça o rapaz", concordou o presidente, mostrando a porta perto de Calinoff.
Anos antes, quando o presidente Clinton veio assistir a uma corrida da
NASCAR, o público vaiou. Em 2004, quando o presidente Bush chegou com o
lendário piloto Bill Elliot em sua comitiva, Elliot desceu primeiro e a multidão
irrompeu em aplausos. Até os presidentes podem utilizar um ato de abertura.
Com um clique e um outro som abafado, o chefe da segurança puxou um
pequeno botão de proteção que permitia abrir a porta blindada pelo lado de fora.
Depois de alguns segundos, a porta se abriu, a luz e o calor da Flórida penetraram
no carro, e Calinoff desceu ao chão uma de suas botas de vaqueiro, feitas à mão.
"E, por favor, deem as boas-vindas ao ganhador da Taça Winston, por quatro
vezes... Mike Caaaalinoff!" gritou o locutor através do estádio.
A deixa enlouqueceu a multidão.
"Nunca se esqueça", sussurrou o presidente para o seu convidado, enquanto
Calinoff saía do carro para receber os aplausos dos duzentos mil fãs. "É isso que
viemos ver aqui."
"E agora", continuou o locutor, "o nosso grande mestre de cerimônias para a
corrida de hoje, na Flórida... O presidente Leeeee Maaaaaaning!"
Logo atrás de Calinoff, o presidente desceu do carro, a mão direita levantada
e acenando, a esquerda batendo orgulhosamente no logo da NASCAR no peito de
sua jaqueta esportiva. Ele parou por um momento para esperar pela primeira-
dama. Como sempre, dava para ler os lábios de cada fã na tribuna principal. Aqui
está ele... Aqui está ele. .
Aqui estão eles... Então, logo que a multidão assimilou o fato, os, flashes
começaram a estourar. Senhor presidente, por aqui! Senhor presidente...! O
presidente mal tinha dado três passos e Albright já estava atrás dele, seguido por
Boyle.
Eu desci por último. A luz do sol forçou-me a piscar, mas eu ainda estiquei o
pescoço, fascinado pelos duzentos mil fãs que agora estavam de pé, apontando e
acenando para nós.
Dois anos depois de terminar a universidade, essa era a minha vida. Nem
mesmo as estrelas do rock têm uma vida tão boa.
Estendendo o braço para um aperto de mãos, Calinoff foi rapidamente
rodeado pela multidão de pilotos que o sufocavam com abraços e tapas nas

costas. Na frente da multidão estava o CEO da NASCAR e sua esposa,
surpreendentemente alta, para cumprimentar a primeira-dama.
Aproximando-se dos pilotos, o presidente sorriu. Ele era o próximo. Em três
segundos ele foi rodeado — a única jaqueta preta em um mar de blusões
coloridos de Pepsi, M & M's, De Walt e Lone Star Steak House. Como se ele
tivesse ganhado as Séries Mundiais e o Super Boliche, e o...
Pah, pah, pah.
Foi tudo o que ouvimos. Três pequenos pahs. Como bombinhas. Ou um
barulho de escapamento.
"Tiros! Tiros! Tiros disparados!", gritava o locutor.
"Abaixem-se! Voltem!"
Eu ainda estava sorrindo quando o primeiro grito agudo atravessou o ar. O
grupo de pilotos se espalhou — correndo, caindo, entrando em pânico em um
instante borrado de cores.
"Deus deu poder aos profetas...", gritava um homem com cabelos pretos em
desordem e uma voz profunda do meio da agitação. Seus pequenos olhos cor de
chocolate pareciam demasiado próximos um do outro, enquanto seu nariz
proeminente e as sobrancelhas finas e arqueadas lhe davam um aspecto de
estranha cordialidade que por algum motivo me fez lembrar de Danny Kaye.
Apoiado em um joelho e segurando uma arma com as duas mãos, ele estava
vestido como um piloto com um blusão de corrida preto e amarelo brilhante.
Como um abelhão, eu pensei.
"... mas também aos horrores..."
Eu continuei olhando para ele, paralisado. O som desaparecera. O tempo se
tornara lento. E o mundo aparecia em preto-e-branco, o meu próprio jornal
cinematográfico.
Foi como na primeira vez que encontrei o presidente. O aperto de mão
pareceu durar uma hora. Alguém chamou isso de viver entre os segundos. O
tempo parado, imóvel.
Ainda fixado no abelhão. Eu não conseguia dizer se ele estava vindo para a
frente ou se todos ao seu redor estavam recuando.
"Homem no chão!", gritou o chefe de segurança.
Eu segui o som e o movimento da mão apontando para um homem em um
terno azul-marinho, deitado com o rosto voltado para o chão. Oh, não, Boyle. Sua
testa estava pressionada contra o asfalto, seu rosto contorcendo-se em agonia. Ele
estava segurando o peito, e eu podia ver o sangue começando a formar uma
poça debaixo dele.
"Homem no chão!", gritou de novo o chefe da segurança.
Meus olhos se desviaram procurando pelo presidente. Eu o encontrei bem no
momento em que meia dúzia de agentes vestidos com macacões investia contra
a pequena multidão que já se encontrava ao redor dele. Os agentes desvairados

estavam se movendo tão rapidamente que as pessoas mais próximas de Manning
ficaram presas contra ele. "Retirem-no! Agora!", gritou um agente.
Pressionada de costas contra o presidente, a esposa do CEO da NASCAR
estava chorando.
"Vocês a estão esmagando!", gritou Manning, agarrando seu ombro e
tentando mantê-la em pé. "Deixem-na ir!"
O Serviço não se importou. Atropelando-se ao redor do presidente, eles
empurravam violentamente a multidão que estava à frente e do lado direito. Foi
então que a força que os mantinha em movimento levou a melhor. Como uma
árvore recém-cortada, a aglomeração de pessoas caiu para o lado, em direção
ao chão. O presidente ainda estava lutando para libertar a esposa do CEO. Uma
luz brilhante explodiu. Eu lembro do clarão do flash sumindo.
"... assim as pessoas podem testar sua fé...", rugia o atirador quando um grupo
separado de agentes em macacões o agarrou pelo pescoço... sua arma... a parte
de trás de seu cabelo. Em câmera lenta, a cabeça do abelhão caiu para trás,
depois seu corpo, enquanto mais dois tiros atravessavam o ar.
Senti uma picada de abelha na minha bochecha direita.
"... e ponderar sobre o bem e o mal!", gritava o homem com os braços
estendidos como Jesus quando os agentes o empurraram para o chão. Todos ao
seu redor, outros agentes, formaram um círculo muito apertado, exibindo
ostensivamente as Uzis semiautomáticas que haviam tirado de suas mochilas de
couro e das mochilas que traziam às costas.
Eu bati em meu rosto, tentando matar o que havia me mordido. Alguns passos
adiante, a multidão que rodeava o presidente colidiu com o asfalto. Dois agentes
na lateral agarraram a primeira-dama, empurrando-a para longe. O restante dos
agentes não parou de empurrar, batendo, pisando nas pessoas, enquanto tentavam
chegar a Manning e protegê-lo.
Eu olhei enquanto a poça debaixo de Boyle se tornava maior. Sua cabeça
agora repousava em um líquido branco como leite. Ele havia renunciado.
Por detrás dos agentes que rodeavam o presidente, nosso chefe de segurança
e um outro agente de terno e gravata agarraram os cotovelos de Manning,
levantaram-no e empurraram-no, pela lateral, direto em minha direção. O rosto
do presidente aparentava dor. Procurei sangue em sua roupa, mas não encontrei
nenhum vestígio.
Rapidamente, os agentes estavam indo para a limusine. Mais dois agentes se
encontravam bem atrás deles, segurando a primeira-dama por debaixo de seus
braços. Eu era a única coisa em seu caminho. Tentei dar um passo para o lado,
mas não fui suficientemente rápido. Com velocidade máxima, o ombro do chefe
de segurança bateu contra o meu.
Caindo para trás, eu me estatelei contra a limusine, com o traseiro batendo
logo acima do pneu direito da frente. Eu ainda vejo tudo como se estivesse fora

do corpo em câmera lenta: tentando manter o equilíbrio... batendo minha mão
contra a tampa do motor... e o som do meu impacto. O som era muito distorcido,
eu podia ouvir o ruído de uma coisa mole e líquida. O mundo ainda estava em
preto-e-branco.
Tudo, exceto a impressão de minha própria mão era vermelho.
Confuso, levei de novo a mão ao rosto. Ela deslizou pela minha pele, que
estava escorregadia, molhada e cheia de dor.
"Vá, vá, vá!", gritou alguém.
Os pneus rodaram. O carro deu uma guinada. E a limusine ganhou
velocidade saindo de baixo de mim. Como uma lata de soda limonada esquecida
no telhado, eu caí para trás batendo meu traseiro. Percebi que me feria em um
punhado de pedras. Mas tudo o que eu podia realmente sentir era o tique-taque,
tique-taque pulsando na minha bochecha.
Olhei para a palma de minha mão, e vi que meu peito e o ombro direito
estavam ensopados. Não por água. Algo mais denso... e mais escuro... vermelho-
escuro. Oh, Deus, será que...?
Um outro flash estourou. Não era apenas o vermelho do meu sangue que eu
estava vendo. Agora havia algo azul... em minha gravata... e amarelo... filetes
amarelos na pista. Outro flash explodiu enquanto punhaladas de cores
penetravam em meus olhos. Carros de corrida prateados e marrom e verde
brilhante. Bandeiras vermelhas, brancas e azuis abandonadas nas arquibancadas.
Um menino loiro que gritava na terceira fila com uma camiseta água-marinha e
laranja dos Miami Dolphins. E vermelho... o escuro, vermelho denso por toda a
minha mão, meu braço, meu peito.
Toquei de novo em minha bochecha. As pontas de meus dedos encontraram
algo pontudo. Como um metal... ou... seria um osso? Meu estômago virou de
ponta-cabeça, torcendo-se de náusea. Toquei de novo em meu rosto com uma
leve pressão. Aquela coisa não saía do lugar... O que há de errado com o meu
rost...?
Mais dois flashes me cegaram com luz branca, e o mundo voava em minha
direção muito velozmente. O momento capturado em um estalido de dedos,
ficando obscurecido com a velocidade da luz.
"Não estou sentindo o pulso!" gritou ao longe uma voz profunda. Logo à
frente, dois agentes do Serviço Secreto, de terno e gravata, levantaram Boyle e o
puseram numa maca dentro de uma ambulância que acompanhara a comitiva.
Sua mão direita oscilava dependurada, sangrando pela palma. Eu me lembrei
dos momentos antes do trajeto da limusine. Ele não estaria ali se eu não...
"Ele está algemado! Saiam da frente!" Alguns passos à esquerda, mais
agentes gritavam com aquele monte de pessoas, empurrando-as para chegar até
o atirador. Eu estava no chão com os resíduos de manchas oleosas, lutando para
me levantar, admirado de que tudo estivesse tão obscuro.

Socorro...!, berrei, embora nada saísse de meus lábios.
As arquibancadas se moviam como um caleidoscópio. Caí para trás no
pavimento, ficando ali, minha palma ainda pressionada contra o metal
escorregadio.
"Alguém está...?"
Sirenes soavam, mas elas não aumentavam. O som diminuía.
Logo começou a desaparecer. A ambulância de Boyle... Deixando o local...
Eles estavam me abandonando...
"Por favor... por que não. .?"
Uma mulher gritou num perfeito tom menor. Seu berro atravessou a multidão
enquanto eu olhava para cima, para o céu claro da Flórida. Fogos de artifício...
nós esperávamos ter fogos de artifício. Albright iria ficar irritado...
As sirenes enfraqueceram até se tornar um fraco assobio.
Tentei levantar a cabeça, mas ela não se moveu. Um último flash me atingiu,
e o mundo se tornou completamente branco.
"P-Por que ninguém está me ajudando?"
Naquele dia, por minha causa, Ron Boyle morreu.
Oito anos mais tarde, ele voltou à vida.